Após anos observando a situação do artesanato têxtil no Brasil, especialmente em Curitiba, resolvi expressar as minhas visões deste nicho de mercado por intermédio de postagens e planejamento de um movimento cultural.
Cheguei aqui em fevereiro de 2000, e fiquei encantada com os pequenos anúncios de confecção de “bróia”, lá na Avenida Kennedy. Me deu a impressão gostosa de ter encontrado um lar onde as pessoas cultivavam não somente as infinitas lembranças das avós e bisas que chegaram aqui nesta terra há décadas, cada uma falando uma língua, usando roupas de suas regiões, as artes com fios dentro da anatomia de suas mãos, trazidas junto com agulhas de tricô, crochê e bordado. Aprendi com uma vizinha, no Capão Raso, que o tricô pode ser feito com uma das agulhas presa embaixo do braço. Essa técnica, na minha memória afetiva, tem sotaque polonês e cheirinho de café com bolo até hoje.
Alguns ônibus serviam também de ateliês temporários a senhoras novinhas, até, que faziam peças em tricô ou crochê. Eu gostava de ficar olhando a velocidade das mãos, as cores que usavam, e tentava adivinhar quais peças eram feitas. Vi casaquinhos de bebês, quadradinhos para compor uma colcha… coisas úteis e amorosas. Perto do tubo ou parada, tudo era enfiado na sacola, junto com o meu olhar.
Vinte e quatro anos perfazem uma geração, e hoje não vejo mais as bróias sendo anunciadas, não vejo mais as crocheteiras habilidosas em fazer os tecidos, conversar animadamente e prestar atenção ao trajeto dentro do biarticulado ou Inter 2, tudo ao mesmo tempo.
O que aconteceu para que isso se perdesse? Me pus a continuar observando, comparando os tempos e lamentando o que eu considero uma perda cultural sem tamanho. Passei a ler mais sobre o que pode ter sido uma das sequelas do período da escravidão no Brasil, onde o trabalho manual – ou braçal – era relegado às pessoas que não pertenciam às classes dominantes. Será que netos e netas da Oma, Babcia e Nonna absorveram essa infecção cultural? Possivelmente sim. E é esse tipo de mentalidade que transformou o Artesanato (com letra maiúscula, sim) num ar de coisa imperfeita ou até mal feita, lenta, “improdutiva” por ser de poucas peças por dia. Foi precarizado, falado em voz baixa, até perder seu sentido de Ofício original.
Hoje em dia existe o movimento chamado Slow Fashion. “Oh, nome em inglês, deve ser bacana!”(suspiro) isso é o Artesanato, essa palavra já existe aqui no Brasil desde o século 16…
Por essas memórias agridoces que sinto e pelo amor às artes, em especial as têxteis, resolvi expressar meus sentimentos na forma de um manifesto em prol da retomada do trabalho manual fino, ou seja, aquele que requer a delicadeza e destreza necessárias para transformar um punhado de floquinhos de algodão em tecido, seja ele feito no tear manual, seja através de agulhas. E chamei a esse manifesto e sonho de vida Pessoas de Fibra.